Navegação ilegal faz ilha desaparecer dentro de reserva ambiental no Pará, diz laudo


Após denúncias de pescadores e ribeirinhos, laudo feito a pedido da Polícia Civil mostrou que a Ilha Camará, na região costeira conhecida como salgado paraense, desapareceu pela erosão causada pelo fluxo de lanchas de praticagem. A empresa de navegação Barra do Pará, que guia navios cargueiros na região, foi indiciada pela polícia por danos ambientais. Imagens de satélite mostram Ilha Camará, no lado esquerdo, que desapareceu
ICIBE / UFRA – Parecer técnico da análise espacial do processo de desaparecimento da Ilha Camará – Marapanim (PA)
Após investigar denúncias de pescadores e ribeirinhos, a Polícia Civil do Pará indiciou uma empresa pelo completo desaparecimento da ilha Camará, de aproximadamente 13 campos de futebol, na Reserva Extrativista (Resex) Marinha Mestre Lucindo, em Marapanim, na região costeira conhecida como salgado paraense, a cerca de 165 km da capital Belém.
De acordo com um laudo científico da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), feito a pedido da Polícia Civil em 2023, o sumiço da ilha foi provocado por erosão pela passagem de lanchas de praticagem – atividade na marinha mercante de orientar navios cargueiros – em alta velocidade pelo rio Cajutuba, onde a ilha estava localizada e desapareceu. A ilha foi se decompondo até ficar submersa (veja as imagens de satélite acima).
Os pesquisadores afirmam que não há registros fotográficos da ilha desaparecida, apenas imagens de satélite coletadas desde 1980 e relatos de comunidades locais. Pelas imagens, os pesquisadores da UFRA acompanharam a ilha diminuindo de tamanho aos poucos, ano a ano, até sumir completamente em 2016.
Um outro estudo, feito por pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA), também sobre o sumiço da ilha Camará, identificou cinco impactos socioambientais causados pela praticagem na região:
erosão;
naufrágios de barcos pequenos com riscos de morte;
destruição de redes de pesca;
mudanças na vida marinha;
impactos direto às comunidade de tradições ribeirinhas.
O caso foi investigado pela Polícia Civil por dois anos, e a empresa Barra do Pará, que opera praticagem desde 2003 na região, foi indiciada por crimes ambientais. Durante a investigação, também foi apurado que a empresa opera na área sem licença ambiental.
“O trabalho de inteligência (feito pelos pesquisadores) comprovou que, realmente, houve o desaparecimento da ilha provocado pela erosão devido à ação antrópica, do homem, onde passam as lanchas da empresa investigada e isso foi determinante para o indiciamento da empresa”, afirmou Waldir Cardoso, delegado que investigou o caso.
Não havia registros de moradia na Ilha Camará, mas ela era usada para atividades como lazer e pesca, conforme os relatos dos moradores da região para a polícia. A área é composta de manguezais que são ricos em biodiversidade e importantes para o ecossistema amazônico.
No inquérito, o delegado citou que a empresa investigada não apresentou nenhuma licença ambiental que legitimasse a atividade de trânsito/transporte dentro da Resex. Ele cobrou a produção de estudo de impacto ambiental para que se previnam mais danos “à qualidade de vida e ao equilíbrio do meio ambiente”.
A Resex Marinha Mestre Lucindo foi criada em 2014, depois que a empresa Barra do Pará já estava instalada na região. A área da reserva, de 26,4 mil hectares, tem 32 comunidades ribeirinhas, que vivem da pesca e da coleta artesanal. A gestão é federal, sob responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
“Chama bastante atenção que as licenças apresentadas não dizem respeito à essa atividade (de praticagem), nem de modo genérico, nem muito menos em modo específico”, frisou o delegado.
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A professora Tabila Verena, do Instituto Ciberespacial da UFRA, também reforçou que as análises de imagens de satélites comprovaram que a passagem das lanchas acelerou o processo de erosão da Ilha Camará.
“Essa ilha poderia desaparecer no futuro, sim, não é possível dizer quando, mas também ela poderia ter aumentado, dependendo da quantidade de sedimentos, num fluxo natural de aumento e diminuição, mas o que a gente observou foi um processo antrópico que acelerou o processo de erosão fazendo com que essa ilha, em um intervalo de tempo muito pequeno, desaparecesse do cenário das imagens de satélite”, disse.
Ao g1, a empresa Barra do Pará afirmou que não precisaria de licença para operar nos rios da região, mas obteve, durante as investigações, em 2022, licença municipal para operar apenas em um píer na comunidade Vista Alegre e no depósito de combustíveis instalados na mesma comunidade, às margens do rio Cajutuba, em Marapanim. (veja nota na íntegra ao fim da reportagem).
A Secretaria de Meio do Ambiente do Pará (Semas), o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Ministério Público Federal (MPF) e Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) confirmaram que a empresa não possuía licença ambiental.
Embarcações usadas na praticagem no Pará.
Reprodução / Barra do Pará
Nesta reportagem você também vai ler:
O que é a praticagem?
O que apontaram as investigações?
Como os pesquisadores comprovaram as denúncias?
Empresa atuava sem licença ambiental
O que diz a Barra do Pará?
Pesca e coleta de mariscos são umas das principais atividades dentro da Resex Marinha Mestre Lucindo, no Pará.
GPSA-Amazônias, 2021
O que é a praticagem?
As lanchas, alvo da investigação, são usadas para levar os navegadores, conhecidos como práticos, que conduzem os navios a áreas de difícil navegação pela costa. Eles saem do píer Vista Alegre, que fica dentro da Resex, até o alto mar, mas fora da reserva ambiental, por onde passam navios cargueiros. O tráfego entre píer e o alto mar foi o que causou a erosão.
A Lei federal 14.813/2024, que regulamenta o serviço, define a praticagem como atividade essencial e de natureza privada, que tem o objetivo de garantir a segurança da navegação, da vida humana e da proteção ao meio ambiente.
A lei também define zona de praticagem como uma “área geográfica delimitada em razão de peculiaridades locais que dificultam a livre e segura movimentação de embarcações”. O prático é responsável por auxiliar o comando de navios para garantir a segurança da navegação na entrada e saída de portos, canais, terminais e em áreas de preservação ambiental.
Segundo o professor Robson Carrera, da UFRA, a praticagem é uma ação importante e tradicional da marinha mercante no litoral paraense.
“A embarcação chega em alguns pontos que ela precisa ser navegada por alguém que conheça a área. E como regiões costeiras, principalmente na Amazônia, são muito dinâmicas, é preciso que o ‘prático’ oriente essa embarcação de um ponto ao outro, para levá-la em segurança”.
As grandes embarcações que circulam por essa área chegam à região costeira transportando produtos diversos de exportação em uma rota internacional, que fica a mais de 50 quilômetros da Resex.
Um dos principais destinos das embarcações que precisam ser guiadas pela praticagem é o porto de Vila do Conde, em Barcarena – importante polo de exportações na região. O porto fica a cerca de 300km da Resex Marinha Mestre Lucindo.
Ilha desaparece no Pará e resulta em investigação policial
O que apontaram as investigações?
As denúncias sobre os impactos da presença das lanchas de praticagem na Resex chegaram em outubro de 2021 à Delegacia de Repressão e outros Crimes Ambientais (Dema), da Polícia Civil, depois que os pescadores se uniram para oferecer uma ação contra a empresa.
O inquérito foi conduzido pelo delegado Waldir Cardoso, que coletou depoimentos tanto dos moradores da Resex, quanto de funcionários da empresa Barra do Pará, entre práticos e oficiais da marinha mercante.
De acordo com o inquérito, “a empresa investigada (…) não apresentou nos autos qualquer licença ambiental apta a tornar lícita a atividade de transportes, em fluxo intenso e com potentes motores, com as lanchas usadas pelos práticos da empresa transitando em rio da Unidade de Conservação e em impacto direto no ecossistema local”.
O g1 teve acesso ao inquérito da Divisão Especializada em Meio Ambiente e Proteção Animal (Demapa), de 968 páginas, cujo alvo é a empresa de navegação Barra do Pará, e seus 32 sócios, investigada como “causadora de grande dano ambiental” por ter afetado comunidades tradicionais e provocado o desaparecimento da ilha.
Lanchas da empresa Barra do Pará, com autorização da Capitania dos Portos, realizam manobras no Terminal de Uso Privativo (TUP) Vila do Conde, da Hidrovias do Brasil, em Barcarena (PA).
Divulgação / Barra do Pará
Além disso, por atuar sem licenciamento ambiental dentro da Resex.
A Barra do Pará foi indiciada pela polícia e o caso foi remetido ao Ministério Público do Estado (MPPA), mas ainda não há prazo para conclusão de análise antes que seja enviado à Justiça.
A empresa foi indiciada pelos seguintes crimes previstos pela Lei dos Crimes Ambientais:
(art. 40) – danos em unidade de conservação;
(art. 60) – “(…) instalar ou fazer funcionar (…) serviços potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais (…)”.
“Segundo os pescadores artesanais se não sair da frente ‘eles passam por cima’. O trajeto dominado por essas embarcações sofisticadas é o canal próximo da margem esquerda do rio, lado confinante com a parte continental da Resex e onde existem a maior quantidade de rios e igarapés tributários da bacia do rio Cajutuba. Ou seja onde a interação dos elementos, substâncias, microorganismos da água doce fazem a interação bioquímica com a água salgada de onde resultam zooplanctons e fitoplantactons essenciais à cadeia ecológica e à manutenção da vida de todo o ecossistema do mangue”.
Pesca e coleta é modo de vida dentro da Resex Mestre Lucindo, no Pará.
GPSA-Amazônias, 2021
Como os pesquisadores comprovaram a denúncia?
Foram dois estudos desenvolvidos na região: um da UFPA, a pedido da comunidade e que foi anexado em ação de 2021; e outro, da UFRA, feito a pedido da polícia, e concluído em 2023.
Os pesquisadores da UFPA ouviram pescadores artesanais da região. Eles relataram que a atividade de praticagem “se apropria quase que exclusivamente de zonas e rotas centenárias da pesca artesanal” e, “sem exceção, nunca tinham sido convidados a qualquer audiência pública sobre a instalação da atividade na região”.
Os estudos da UFRA observaram uma segunda ilha na região, que fica fora da rota das lanchas, e que não sofreu tantos impactos de erosão – o que acabou comprovando que as lanchas contribuíram para que a ilha Camará tenha desaparecido.
Desde 2016, o Núcleo de Meio Ambiente (Numa) da UFPA já realizava os levantamentos sobre conflitos socioambientais em unidades de conservação, como a Resex Marinha Mestre Lucindo. Entre eles estava a atividade de praticagem na região do rio Cajutuba, que atravessa a Resex.
“Possuindo motores de alta potência, a navegação dessas lanchas rápidas naquele local constitui elemento ‘poluidor’ e depredador, uma vez que o efeito (…) em zonas de locais de reprodução da fauna marinha e de pesca artesanal traz grande impacto socioambiental”, citou o estudo.
Os relatos dos ribeirinhos apontaram que as embarcações passavam em alta velocidade ao menos duas vezes ao dia pelo rio Cajutuba. Práticos disseram à polícia que o fluxo das lanchas dependia da presença dos navios cargueiros no alto mar.
Os estudos do Laboratório de Agrimensura e Levantamento Fundiário, na UFRA, acabaram comprovando o desaparecimento “rápido e abrupto” da ilha – descoberta que acabou levando à conclusão do inquérito policial, que tramita na Vara Única de Marapanim do Tribunal de Justiça do Pará, e ainda aguarda análise da promotoria de Justiça.
O presidente da Associação de Usuários da Reserva Extrativista Marinha Mestre Lucindo (AUREMLUC), Daniel Oeiras disse ao g1 que os impactos vão além do sumiço da ilha.
“Muitas espécies de peixes também desapareceram devido à grande velocidade que eles passavam com as lanchas. Fizemos o levantamento de 282 pessoas prejudicadas e depois de toda essa pressão eles até resolveram diminuir a velocidade das embarcações”, relatou.
Segundo ele, a comunidade mais afetada foi a de Tauaçu-Tamaruteu e seus pescadores, pois algumas espécies de peixes não foram mais encontradas naquele trecho do rio.
“Essas lancham pegam os práticos em Vista Alegre e levam até os navios no oceano e elas trafegam com muita velocidade, fazem com que desapareça tudo: os peixes, camarão, suru, pescada também, tudo isso sumiu”. Ele também relatou que se lembra da ilha que desapareceu.
“Há 15 anos existia uma ilha, uma ponta (…) maravilhosa. Aí o pessoal de Belém, os turistas vinham, atravessavam de um lado para o outro para ir tomar banho naquela praiazinha muito bonita ali. Aí com as atividades da praticagem desapareceu a ilha”, disse.
Os estudos feitos na UFPA indicaram:
que a alta velocidade de trânsito e a potência dos motores causam erosões, assoreamento de praias e canais e a perda de matas ciliares locais;
diminuição dos estoques de peixes, camarões e mexilhões;
não tem mais quantidade suficiente de pescados para as comunidades;
não foi encontrado registro sobre licenciamento ambiental no ICMBIO, no Ibama ou na Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas).
que instalação da atividade por mais de uma década não foi precedida de Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) ou quaisquer procedimentos legais previstos nas resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).
que se a empresa de praticagem detinha alguma licença seria irregular ou nulo já que as comunidades afirmam não ter sido consultadas.
A nota técnica concluída em 2021 também recomendava urgente resolução dos conflitos e reparação dos danos já causados às famílias de pescadores e ribeirinhos.
A partir do estudo feito, cerca de 100 ribeirinhos se uniram em uma ação coletiva contra a empresa Barra do Pará.
A denúncia apresentava este primeiro parecer técnico, mencionando que as comunidades estavam sendo afetadas com o tráfego embarcações.
“São violações socioambientais, entre elas, o naufrágio de pequenas embarcações, os danos nas casas e redes de pesca, alteração do ecossistema do mangue e todo modo de vida em locais de reprodução de espécies, pelas quais essas comunidades aguardam ações de reparação”, afirmou o advogado Ismael Moraes, que representa os ribeirinhos na ação.
Delegado Waldir Freire e escrivã Elaine Coutinho coletam depoimentos em diligências dentro da Resex.
Reprodução / Arquivo Pessoal
Em abril de 2023, ele solicitou novos estudos, desta vez, a pesquisadores do Instituto Ciber Espacial (ICIBE) da UFRA para comprovar relatos de que a ilha Camará teria desaparecido.
Após as comprovações, a polícia ambiental do Pará concluiu as investigações e indiciou pelos danos a empresa Barra do Pará.
Em uma unidade de preservação federal, como a Resex Marinha Mestre Lucindo, a lei ambiental brasileira prevê pena de prisão de um a seis meses, além de multa, a quem “construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes”.
A Barra do Pará possui sede em Belém e atua na zona de praticagem, abrangendo a capital e o Complexo Portuário de Vila do Conde, na cidade de Barcarena, e adjacências.
À polícia, a empresa afirmou que “as lanchas trafegam (na Resex Marinha Mestre Lucindo) de acordo com as normas da Marinha do Brasil”, e “que não provocam nenhum tipo de dano ambiental na área”.
Nos depoimentos, funcionários disseram que o trabalho da praticagem na Resex é regido pela Marinha, a partir de uma base operacional que funciona como centro de controle em um píer na área conhecida como Vista Alegre.
Especialista explica como foi feito estudo que comprovou desaparecimento de ilha no Pará
Os relatos também mostraram que os turnos no local funcionam em escala de rodízio supervisionado pela Capitania dos Portos da Amazônia Oriental, com 37 práticos, e que normalmente duas lanchas operam dentro da Resex.
Ao g1, a empresa afirmou que “atua de acordo com as normas de segurança de tráfego marítimo e cumpre todas as medidas de mitigação e monitoramento de impacto exigidos pelas licenças e autorizações concedidas; e permanece sempre à disposição dos órgãos públicos e da comunidade para construir a melhor solução para eventuais conflitos socioambientais” – (o posicionamento completo está no final da reportagem).
“Esse fenômeno (desaparecimento) é resultado das atividades humanas presentes na região e representa uma ameaça significativa ao equilíbrio ambiental”, concluiu o estudo da UFRA.
As análises feitas com imagens de satélite coletadas entre 1985 e 2021 concluíram que a praticagem “desempenhou papel significativo na alteração da dinâmica natural da área, o que (…) contribuiu para o desaparecimento da ilha” em 2016.
Laudo conclui que ilha desapareceu em reserva ambiental devido a ‘processo de degradação de origem antrópica, que teve impactos no meio ambiente’.
Reprodução / Inquérito policial
Segundo professora e pesquisadora Tabilla Verena, o processo natural de erosão que acontece nessa região também foi levado em consideração, mas ficou comprovado que ele sozinho não foi responsável pelo sumiço da Ilha Camará.
“A zona costeira, principalmente na zona costeira amazônica em que há um litoral baixo, com forma de relevo que se altera com muita frequência, e com muitos sedimentos do mar e do rio, ilhas podem surgir e podem desaparecer em um intervalo de tempo relativamente pequeno, isso é um processo natural da zona costeira. Mas no caso da Ilha Camará, houve a interferência da erosão provocada pela praticagem. Fizemos um levantamento bem detalhado das imagens de satélite e conseguimos basicamente comparar a ilha Camará com uma outra ilha que não fica na rota dos navios para mostrar que o excesso de erosão realmente ocorreu por conta dessas embarcações”.
Empresa atuava sem licença ambiental
Um ponto das investigações da Demapa foi também a autorização da atividade. Órgãos competentes confirmaram à polícia no decorrer do inquérito que, mesmo em área de preservação, a presença dos navios não tinha permissão adequada.
Um ofício do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) indica que há necessidade de licenciamento para a atividade. Já o Ministério Público Federal (MPF) apontou que a empresa Barra do Pará – Transportes e Serviços Marítimos LTDA não tinha a licença.
Em nota, a Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas), responsável pelas licenças ambientais no estado, confirmou que a empresa não é licenciada pelo órgão estadual e que “a Marinha do Brasil é a autoridade responsável pela regulação da atividade de praticagem em todo o país”.
Já o ICMBio, responsável pela gestão da Resex, informou que “analisa os impactos socioambientais da atividade na Resex Marinha Mestre Lucindo, a fim de propor medidas mitigadoras com base no regime protetivo da unidade de conservação”. “As condicionantes para possível emissão de autorização também são avaliadas pelo Instituto, e a regulamentação da praticagem cabe à autoridade marítima”, concluiu.
Comunidade ribeirinha na Resex Marinha Mestre Lucindo, em Marapanim, no Pará.
Reprodução / Arquivo Pessoal
O g1 também solicitou posicionamento da prefeitura de Marapanim, sobre o licenciamento ambiental da empresa, mas não havia obtido resposta até a última atualização desta reportagem.
A Capitania dos Portos da Amazônia Oriental (CPAOR) disse que “é responsável por fiscalizar se o serviço de praticagem está sendo cumprido de acordo com as Normas da Autoridade Marítima para o serviço de praticagem” e que, “para isso, equipes de inspetores navais realizam ações de fiscalização em empresas de praticagem na região para verificação do cumprimento das normas supracitadas”.
“Itens como a validade de inscrição e homologação de embarcações para transporte de práticos, cumprimento pelos práticos da escala de rodízio única e do plano de manutenção de habilitação são objeto das inspeções realizadas pelos militares da CPAOR.”
Em relação à Reserva Extrativista (Resex) Marinha Mestre Lucindo, a CPAOR disse que “vem contribuindo com os órgãos de justiça e ambientais competentes para elucidação do caso. Exemplo disso é a cessão de um assistente técnico para perícia judicial, a pedido da Procuradoria – Regional da União da 1º Região”.
O que diz a empresa investigada
Já a empresa Barra do Pará disse em nota ao g1 que:
“A BARRA DO PARÁ é uma empresa que atua na Zona de Praticagem 03 (ZP3), que abrange Belém e o Complexo Portuário de Vila do Conde e Adjacências (PA), conforme as Normas da Autoridade Marítima (Marinha do Brasil) que regulamentam o Serviço de Praticagem, em conformidade com a Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário (LESTA), exercendo atividade essencial.
As Zonas de Praticagem (ZP) e os pontos de espera dos Práticos são estipulados pela Autoridade Marítima, sem a participação das Empresas de Praticagem na tomada de decisão. A empresa BARRA DO PARÁ TRANSPORTES MARÍTIMOS é autorizada para atuar na ZP-3 e fiscalizada pela Autoridade Marítima, por meio das normas e procedimentos da Capitania do Portos da Amazônia Oriental – NPCP 2022.
Além da designação direta pela NPCP 2022, a Base de Vista Alegre tem sua Atalaia homologada pelo Conselho Nacional de Práticos – CONAPRA, reconhecido pela autoridade marítima como órgão de representação nacional com competência para homologação, de acordo com a NORMAM 311.
Desde 2003, a empresa mantém a Base Operacional na Comunidade de Vista Alegre, em Marapanim – PA, para que os práticos atendam com segurança os navios mercantes que demandam ou partem no trecho do Rio Pará compreendido entre os Portos de Belém e Vila do Conde até a Foz do Rio Pará, tanto pelo Canal do Espadarte quanto pelo Canal do Quiriri, enfim, todos os navios que abastecem com produtos, grãos e combustíveis, bem como exportam nossas comodities impulsionando a economia da região norte do Estado do Pará.
De acordo com as conclusões do parecer técnico referido, “Análise Espacial do Processo de Desaparecimento da Ilha de Camará-Marapanim/PA”. Considerando que o Rio Cajutuba, utilizado para acesso ao ponto de espera para os Práticos é de livre trânsito de distintas embarcações, incluindo o trânsito de lanchas da Barra do Pará e de outras empresas de praticagem, seria necessário um complexo estudo para a identificação dos fatores naturais e antrópicos e sinergia de impacto de todos os fatores para identificar em que medida existe fundamento nessa imputação da causa pelo tráfego de embarcações de qualquer tipo, e em qual proporção haveria alguma relação de causa e efeito com o trânsito unicamente das lanchas da empresa Barra do Pará o que supostamente teria contribuído para o desaparecimento daquela Ilha em especial.
Em relação aos relatos relacionados aos danos em redes de pesca, esclarecemos que a Barra do Pará há muito tempo vem realizando voluntariamente o reparo das rede dos pescadores, ainda que a causa dos incidentes seja pelo bloqueio indevido do canal de navegação profundo (via obrigatória de passagem das lanchas de praticagem) com a colocação transversal das redes de pesca quase que de uma margem à outra, podendo isto estar relacionado com a ausência de plano de manejo da Resex e zoneamento da área e a falta de fiscalização quanto ao uso indevido das redes de pesca que são colocadas por toda a largura do Rio Cajutuba, sem sinalização adequada e sem a permissão de passagem para as lanchas e demais embarcações que trafegam naquela parte do Rio, contrariando a legislação de segurança de tráfego marítimo. Por outro lado, a atuação da Praticagem é essencial para própria segurança ambiental e prevenção de acidentes no local, com constante atuação da Barra do Pará isolada ou em cooperação com os órgãos públicos no salvamento de pescadores envolvidos em acidentes com suas embarcações, assim colaborando para a segurança da navegação e para a salvaguarda da vida humana nos mares e rios e para a proteção do meio ambiente.”
Questionada sobre o licenciamento para operar dentro da Resex, a empresa disse que “atua na Base de Vista Alegre de forma regular e possui todas as licenças e autorizações previstas pela legislação e exigidas pelos órgãos ambientais”.
“O IBAMA, por meio do Ofício n. 541/2021/ COHID/CGTEF/DILIC, datado de 20/12/2021, expressamente se manifestou sobre a ‘desnecessidade de licenciamento ambiental, em relação ao trapiche e ancoradouro localizados no interior da Resex Marinha Mestre Lucindo, considerando o pequeno porte das estruturas e o baixo potencial de impacto ambiental da atividade, conforme o disposto na Resolução CONAMA n. 369/2006’ e ressaltou a necessidade de autorização do Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade – ICMBio.
Em relação às outras estruturas localizadas na comunidade de Vista Alegre, o IBAMA afirma que não são de competência federal, de acordo com a Resolução CONAMA 140/2011.
A Barra do Pará possui Licença Ambiental da Secretaria de Meio Ambiente do Município de Marapanim para a estrutura e as atividades da Base em Vista Alegre, LO 16/2022, com validade até 2026. Em relação ao trapiche e ancoradouro que estão situados na Resex Marinha Mestre Lucindo, a Barra do Pará possui Autorização Direta do ICMBio, deferida por meio do Ofício SEI n. 195/2023/NGI ICMBio Salgado Paraense. Ressaltamos que Autorização do ICMBio foi objeto de aprovação por unanimidade pelo Conselho Gestor da Resex Mestre Lucindo, com consulta às comunidades locais diretamente interessadas.”
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