Farmácia é condenada a pagar indenização de R$ 15 mil para cozinheira negra que teve bolsa revistada: ‘Alívio’


Caso aconteceu em uma das unidades da rede Nissei em Bauru (SP), em maio de 2022. Decisão é em primeira instância e empresa informou ao g1 que irá recorrer da decisão. Cozinheira participou de protesto contra o racismo em Bauru na época
Arquivo pessoal
Uma rede de farmácias foi condenada pela Justiça a pagar uma indenização por danos morais no valor de R$ 15 mil para uma cozinheira negra que teve sua bolsa revistada após comprar medicamentos no local. A decisão do juiz André Luís Bicalho Buchignani, da 6ª Vara Cível de Bauru (SP), é da última quarta-feira (24) e ainda cabe recurso.
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O g1 entrou em contato com a assessoria de imprensa da rede de farmácias Nissei. Em nota, a empresa informou que reitera “o compromisso com os valores da marca, principalmente o respeito aos clientes, colaboradores e parceiros”, e que, ao tomar conhecimento da denúncia, “prontamente tomou medidas internas de apuração”. A rede informou ainda que irá recorrer da decisão.
O caso aconteceu no dia 20 de maio de 2022. A cozinheira Regiane Rosa chegou a registrar um boletim de ocorrência e afirmou ter sofrido um crime de injúria racial. No entanto, na época, o caso foi registrado como de natureza não criminal e não houve andamento na esfera criminal.
No documento, ela contou que fazia compras no local e por duas vezes um funcionário se aproximou para saber se ela precisava de ajuda, mas ela respondeu que não.
Depois de passar no caixa e pagar pelos remédios que havia comprado, ela foi abordada na porta do estabelecimento pelo gerente e esse funcionário e eles pediram para que ela mostrasse o que tinha na bolsa. Uma situação que, segundo Regiane descreveu na época, muito constrangedora.
“É constrangedor você sair do emprego, passar para comprar remédio para seus filhos e passar por uma situação dessa, como se estivesse roubando, com as pessoas dentro da farmácia olhando para mim.”
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Ação por danos morais
Em janeiro do ano passado, a cozinheira ingressou junto com seu advogado, Tiago Sousa, com uma ação de indenização por danos morais. De acordo com o advogado, inicialmente foi tentado um acordo, porém, a empresa não concordou.
“Houve uma tentativa de conciliação, mas a empresa sempre negou os fatos, disseram que nunca aconteceu. Nós chegamos inclusive a solicitar as imagens do dia, porém, eles afirmaram que são apagadas automaticamente depois de um tempo. Mas, dessa forma eles também não conseguiram comprovar que não houve o constrangimento ilegal”, explica Tiago em entrevista ao g1.
Ainda segundo a defesa de Regiane, o depoimento de uma testemunha que presenciou toda a abordagem dos funcionários foi essencial para a condenação da empresa. “Ela foi embora muito abalada da farmácia, depois de tirar tudo da bolsa, e uma cliente que também estava no local a procurou no ponto de ônibus e ofereceu a ajuda. O depoimento dessa testemunha confirmou tudo que a Regiane havia contado”, completa.
Na decisão, o juiz estabelece que “a indenização é devida, posto que demonstrada a ofensa aos direitos da personalidade da autora[…] O constrangimento a que submetida pessoa acusada de prática de furto em mercado e revistada por seguranças particulares do estabelecimento comercial é suficiente para gerar dano moral e determina o dever de indenizar”, diz no documento.
E completa, “não há dúvida do constrangimento sofrido pelo autor em razão da conduta ofensiva do preposto da loja, que supôs, sem fundamento válido, que o autor teria furtado produtos […] Diante disso, justifica-se a indenização concedida na sentença. O Tribunal tem reconhecido o direito à indenização por danos morais àqueles expostos publicamente a constrangimento e humilhação decorrentes de abordagens motivadas por suspeita de furto.”
Justiça feita
Apesar da decisão ainda ser em primeira instância, Regiane acredita que a justiça está sendo feita.
“Eu me sinto aliviada. Porque desde o momento que aconteceu isso comigo, eu nunca mais fui a mesma pessoa. Hoje, quando eu entro em algum estabelecimento que alguém, eu vejo alguém andando, ou passa duas ou três vezes próximo a mim, isso já me faz mal”, conta em entrevista ao g1.
“Enfim, é um sentimento de alívio, pois a justiça prevaleceu e essa decisão serve para dizer que as pessoas negras merecem respeito e um tratamento digno”, completa.
Inicialmente, a defesa da cozinheira havia pedido uma indenização de R$ 50 mil, mas a Justiça estabeleceu valor menor e o advogado informou que ainda analisa se irão recorrer para aumentar essa quantia. Porém, Tiago destaca a importância de decisões como essas no combate à discriminação.
“É uma decisão que tem o caráter punitivo e pedagógico para desestimular que empresas cometam novamente erros assim que têm como vítimas, em sua grande maioria, as pessoas pretas e pardas”, destaca.
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